29 junho, 2011

Caso Desafiante

As fraturas de alto impacto (Ferimento por Arma de Fogo) são lesões altamente desafiantes. Primeiro, porque o processo cicatricial é totalmente diverso do comumente observado: as lesões ocorrem não somente no trajeto do projetil no interior do tecido, mas também ao seu redor, criando um espaço virtual e temporário, que muitas vezes não é identificado nos exames por imagem mas que fatalmente é afetado no decorrer do processo de cicatrização.


"Espaço virtual" causado pelo distendimento dos tecidos durante a passagem do projétil

Segundo, os ferimentos por arma de fogo provocam fraturas por explosão, raramente ocorrendo nos pontos mais frágeis que normalmente estão fraturados nos ferimentos de baixo impacto (suturas ósseas), tornando a reconstrução muito mais difícil.

Vista póstero-anterior de um crânio, com as suturas ósseas representadas

Nos deparamos com um caso bastante desafiante. O paciente, vítima de ferimento por arma de fogo, recebeu disparo no lado direito da face, com o ferimento de saída do projetil no lado esquerdo, na região do osso temporal. Pelo trajeto do projetil, foi destruindo várias estrutura anatômicas: septo nasal, parede lateral nasal, rebordo infra-orbitário, assoalho de órbita, transfixando o seio maxilar e o globo ocular esquerdo (que foi perdido) e sutura fronto- zigomática esquerda.


A complexidade das fraturas nos dava um prognóstico pobre

Repare na perda de substância óssea, especialmente nos ossos nasais

Os artefatos tomográficos mostram claramente o trajeto do projétil

Vista inferior mostrando a destruição do seio maxilar e assoalho de órbita

Múltiplos fragmentos ósseos fraturados

Apesar da fratura no osso frontal, não houve comprometimento neurológico

Optamos, conjuntamente com médico oftalmologista, pela enucleação do globo ocular afetado, que não mais tinha função e poderia geral um processo infeccioso. Como haviam muitos fragmentos ósseos espalhados pelo campo cirúrgico, usamos placas longas, abrangendo o maior número possível de fragmentos ósseos que ainda estavam com irrigação sanguínea (condição para a correta consolidação óssea).

Mesmo com a enucleação do globo ocular e tecidos anexos, ainda havia extensa desorganização tecidual, inclusive com herniamento de tecido para o interior do seio maxilar, razão pela qual optamos por resguardar o assoalho orbitário com micro-tela de titânio para posterior reposição protética.


Placas extensas na região orbitária e nasal

Observe a tela de titânio no assolaho orbitário

A região mais difícil de reconstruir foi a nasal


A placa inferior abrangeu de rebordo infraorbitário até parede nasal lateral

Nesta etapa, o objetivo é devolver as referências anatômicas para posterior reconstrução protética

O globo ocular deverá ser reposto através de prótese

 Corte axial mostrando a reconstrução anatômica do osso zigomático e assoalho orbitário

Apesar de um prognóstico bastante desfavorável, o paciente evoluiu muito bem. O planejamento final ainda prevê a remoção de algumas das placas após a consolidação óssea, especialmente nos ossos próprios nasais, região onde se verificou maior dificuldade na sua reconstrução anatômica devido à grande perda de substância.

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